O adeus ao Mestre

Estreitei meus laços com o Mestre em 2004, quando comecei a fazer parte do seleto grupo que escrevia para o Jornal Tranca e Gamela, recém criado.
Transitar palavras entre ele, Zilda Ribeiro, Alexandre Lourenço, Luiz de Moura e Luizão Freitas, ícones da cultura aparecidense, era algo inimaginável para o “escritor” novato. Um início literário que me marcou profundamente.
As dicas preciosas que ele me passou desde aquele tempo ainda carrego comigo. “Cutucadas” e conselhos. Críticas absolutamente construtivas. Simples e objetivas. Dizia-me sempre que “os jornais evitam a ditadura do conhecimento imposta por aqueles que detêm o poder”.  “Que era preciso escrever, continuar, fazer cada época prevalecer na memória”.
Foi presidente e fundador do MDB, diretório de Aparecida, em 1968 e encabeçou um grupo seleto de aparecidenses que ficou conhecido como um grupo de resistência democrática, fundando à época os Jornais A Verdade e O Lince, acreditando que política se faz com ideias em circulação. Com o Jornal O Lince, acompanhou a política local, tecendo simples e vigorosas “ponderações”. O Mestre Benedicto Lourenço foi candidato a prefeito de Aparecida pelo PTB em 1982, apoiado pelo ex-presidente Jânio Quadros.
Ao longo de seus escritos, também publicou em inúmeros jornais as dimensões do homem moderno e suas complexidades, em textos de teor magnífico sobre o ser. Falou sobre suas crenças e seus valores, além de registrar o levantamento genealógico de famílias tradicionais aparecidenses.
Mais que um estudioso do passado, o Mestre ainda era poeta, cronista e um desbravador. Sua preocupação pelas nossas origens culminou em 2007 na concepção da trilogia “Nossas Origens: Três Séculos de História de Aparecida”, que lançou novas perspectivas e interpretações sobre a fundação e construção de nossa cidade. 
Ainda é possível encontrar na Internet, especificamente no site do Jornal O Lince boa parte de seus textos que narra a Reconstituição da História de Aparecida, publicada até a 18ª parte pelo jornal.
Membro efetivo do Instituto de Estudos Valeparaibanos. Eleito imortal pela Academia Pindamonhangabense de Letras no ano de 2013.
Boêmio em essência. Seresteiro de alma. Caminheiro de sutileza imperial que comandou junto dos saudosos João Lourenço Barbosa, Manoel Ignácio de Moraes, David Martinho e Francisco Salles Souza, o Dinga, muitas caminhadas ao Bairro do Bonfim, Paraty, Santa Cabeça, Lagoinha, Santo Expedito (Rocinha) e Pedrinhas.
Em 2009 foi ele quem me encorajou e se empenhou para que eu pudesse requerer junto ao Ministério do Trabalho meu Registro de Jornalista, tamanho o volume de publicações em vários jornais da região. Assim como ele, tive meu Registro devidamente concedido.
A nossa “formatura”, acontecida em Roseira, junto com outros jornalistas que também entraram com o recurso e alguns baluartes, foi num dia 17 de dezembro, ao som da legendária Corporação Musical Aurora Aparecidense, sob a batuta do Amigo Tadeu Fonseca.
Também colhi dele conselhos e experiências ímpares quando escrevi e lancei meu livro “Os Guardiões da Santa”, em 2013. No dia do lançamento, ele compareceu, mesmo contrariado por estar em campo “inimigo”.
Esse breve apanhado não condiz com a importância e a representatividade do Mestre Benedicto Lourenço Barbosa na sociedade do Vale do Paraíba.
Muito vai se falar sobre a sua irreparável perda. Uma parte da história e da memória que se vai. Lacuna cultural e literária que dificilmente poderá ser preenchida.
Descanse em paz Mestre Dito Lourenço...

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