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Mostrando postagens de agosto, 2013

Retratos de nós mesmos.

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Por Célio Luis Batista Leite (Celinho) O cinema italiano está para o mundo da sétima arte assim com o futebol brasileiro está para o mundo da bola. Giuseppe Tornatore não chega a ser um Pelé, mas pode ser considerado um Garrincha. No filme “O Homem das Estrelas” (1995), este fantástico diretor conta a história de um charlatão que percorre a Sicília, nos anos 40, filmando e retratando pessoas para se tornarem estrelas de cinema, cobrando 1.500 liras por isso. Impressionante ver como rostos simples se transformam diante de câmeras: verdadeiras estrelas daquele momento. Quando assisti ao filme pela primeira vez, foi impossível não me lembrar das cenas que eu via, quando criança, na Praça Nossa Senhora Aparecida. Os “retratistas”, postados em frente à Matriz Basílica, com suas “caixas mágicas”, registrando nas chapas o rosto dos romeiros que vinham rezar aos pés de Nossa Senhora. As fotografias, muitas vezes, retratavam gerações. Eram vários componentes de uma mesma família que, às

Vômito contemporâneo

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Logo de manhã, lá por perto da Praça Kennedy, adentra ao ônibus um sujeito mal trapilho, carregando algumas sacolas plásticas surradas, com um cheiro forte de gente em sua natural essência, contando algumas míseras moedas. Fixou-se de pé, ao meu lado, segurando numa daquelas alças de segurança, onde aos poucos, começou a se dependurar, balançando aos movimentos do ônibus. Foi quando eu comecei a reparar em seu semblante: barba por fazer, olhos vermelhos. Um hálito forte de bebida que sorrateiramente ia inundando as narinas e o ambiente em si. De repente, o sujeito começou a amarelar. Os lábios arroxeados denunciavam seu desconforto. Puxava o ar com força, balançando freneticamente. Foi quando eu achei que ele ia vomitar. Em alguns segundos, minha intuição consolidou-se. E começou a soltar tudo aquilo que lhe acometia: palavras de ordens um pouco desordenadas como “passe livre”, “fora Dilma”, “congresso de merda”, “abaixo a corrupção” e outras coisas mais. O silêncio de

Papéis

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Gari da prefeitura, saiu candidato naquelas eleições mais para pegar alguns meses de licença. Na campanha eleitoral, fez o inverso do que sempre fazia: -Sujou toda a cidade com seus "santinhos" de campanha. Com poucos votos, voltou ao trabalho com muita sujeira para limpar...

Sapeca

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" Menino, vai na venda me buscar um picolé "... Calor demais, chega o menino depois de meia hora apenas com o palito nas mãos e diz: " Foi o sol. Ele derreteu todo o sorvete "... Suas bochechas rosadas disfarçavam o morango de sua boca...

Segredos

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Chicotadas estalavam... Ouvia-se uma voz a gritar: Seu burro, deixa de moleza...Me carregue! O carroceiro também tinha seus fetiches secretos na noite...

Vida longa ao Rei!

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Falar alguma coisa sobre meu camarada Toninho Macedo é fácil. A gente se falou pouco quando ele descobrira sua doença. Nessas poucas vezes, tentou me explicar os meandros daquilo que lhe acometia. Eu, por ordem prática, sempre burlava aquela seriedade. Era assim que se descortinava um belo sorriso. Nossa amizade sempre foi ampla. Ele sempre dizia que os “ diferenciados ” se atraíam com facilidade. Modesto. Falar sobre o maestro Toninho Macedo é remeter a memória para um tempo de glórias. Acordes absolutos em inúmeras fanfarras pelo Vale do Paraíba. O desafio maior era formar, além de músicos de ouvidos apurados, homens de bem. A empreita surtiu efeito de forma surpreendente. Nesse enfoque de sua vida, ser instrutor da fanfarra da cidade do Potim há alguns anos trás talvez tivesse sido o auge dessa missão numa época de muita marginalização na cidade, com jovens perdidos e crianças se perdendo. E ele conseguiu contrapor aqueles destinos que iam fadar muitos ao descontrole s

Rainha do lar

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E ela está sempre ali:   Entre as névoas da manhã, varrendo as folhas do tempo.   Sustentando o mundo com o bailar da sua vassoura. Minha mãe iluminando outra vez o dia...

Mistérios...

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Não tenho o hábito de olhar pra trás ou ao lado quando alguém assovia, fica buzinando ou fica fazendo “psiu” . Se for comigo, tem que chamar pelo nome. Mas foi inevitável não procurar de onde tinha vindo um sonoro “psiu” agora há pouco em frente ao portão dos Cemitério dos Passos. Fiquei curioso por saber quem era, pois o coveiro sabe bem como eu me chamo...  

Olhos vermelhos...

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Estava eu na fila ao guichê da Marrom esperando para colocar “créditos” no novo cartão de passagens da linha Guará/Aparecida quando me chega ao lado um andarilho me pedindo umas moedas. Com certa pressa naquela fila que não andava, lhe disse que não tinha moedas. Diante da afirmação, o pobre homem saiu resmungando e parou por perto querendo me intimidar. Num instante depois, enfiei a mão no meu bolso e tirei meu colírio afim de dar uma gota em cada um dos olhos. Foi quando o cidadão veio de novo ao meu encontro e, talvez querendo mesmo tirar qualquer coisa deste pobre escritor, me pediu sem pestanejar algumas gotas do meu colírio. A fila toda se voltou pra mim na expectativa da minha resposta que foi categórica: -Meu colírio? Meu colírio não... Sei lá o que  você andou olhando por aí mano... E seguiu resignado o pobre homem que não tirava aqueles olhos vermelhos de mim...

Ali...

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Escrevo como se estivesse sempre ali, no quintal da casa. Debaixo das árvores que meu avô plantara. Raso de lágrimas escrevo como se ali o tempo não passasse. Como se o horizonte, em cores ajustadas secretamente por Deus, acendesse as estrelas. Como se o vento soprasse lentamente zunindo, dando voz a ausência. Depois, os pés descalços, num glorioso encontro com o chão, me levando ao alcance de antigas lembranças: a avó regando avencas, despetalando rosas brancas que podiam curar o olhar. Redefinia-me minha avó num sorriso. O gostinho de barro na água lavando o âmago de compor. Escrevo a partir dali, de onde nunca saí. De onde cada palavra morde o silêncio querendo espantar a saudade feito um cão vira lata...