As voltas da vida.


Ela era como muitas.
Vinda de uma família humilde, cresceu sendo molestada por um tio, que no fim das contas, morreu assassinado numa boca de fumo.
Conheceu droga cedo demais ao mesmo passo de quando sua mãe, lavadeira por excelência e necessidade, faleceu, deixando ela e mais dois irmão menores à disposição de um colégio interno.
Presa nas mais íntimas das revoltas, fugiu do internato e ganhou um mundo que não lhe pertencia.
Domia de déu em déu nas praças e calçadas. Comia o que encontrava nas latas de lixo. Por muitas vezes, cometia certos furtos que eram mais pra saciar um vicio que já a dominara há algum tempo.
Nas rodinhas de “nóias”, seu corpo de mulher foi tomando forma e chamando a atenção de alguns viciados. Quando ela se deu conta disso, viu que estava diante de uma nova moeda de troca.
Um belo dia se sentiu mal. Foi quando percebeu que suas regras mensais não estavam mais aparecendo.
Com o patrocínio de um velho aposentado que vivia jogando gamão na praça central e adorava bolinar meninas, comprou na farmácia da esquina um teste de gravidez que mostrou que vinha mais alguém por aí.
Desespero, choro. Sentiu saudade da mãe.
Tentou por várias vezes abortar aquele inocente mas não teve tanta coragem. Eram pedras de crack seu consolo as quais ela conseguia comprar recolhendo latas e papelão pelas ruas.
Nove longos meses se passaram...
Sob um forte sol, sentindo fortes contrações, ela deu a luz a um menino atrás do muro de um terreno baldio.
Enrolado num pano qualquer, nos seus braços trêmulos, ela ainda foi capaz de dar uma última olhada naquele rostinho inocente para depois, jogá-lo numa lata de lixo e voltar para o lixão onde recolhia materiais recicláveis...

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